14 novembro 2005

Ajudar a Morrer

A morte como parte integrante do ciclo da vida humana para além de um processo biológico natural, encerra na sua essência um processo social, bastante doloroso e complexo, quer a nível pessoal, quer a nível familiar. O homem, tendo consciência da sua finitude, sente necessidade de questionar que processo é este afinal. “O ser humano é o animal que pensa na sua própria morte”[1], de acordo com Lepargneur. Tem conhecimento que a sua presença não foi nem será infinita, conhecimento este que o incómoda e perturba.

A morte encerra em si um mistério que ultrapassa o conhecimento biológico e científico. Na realidade, nenhum ser humano sabe o que é verdadeiramente estar morto nem o que tal representa para a pessoa que morre. Neste sentido “A morte é o fenómeno mais universal. Toda a gente acha natural e dá sub entendido que há que morrer. E, no entanto todo o homem vive um protesto secreto contar a morte e um inextinguível horror perante ela.”[2]

A sociedade actual é marcada pela permanente evolução técnica e científica, que exige do ser humano, dos profissionais de saúde, uma constante actualização de conhecimentos e técnicas, ampliando-os ou modificando-os, no sentido de acompanhar esta evolução, aplicando-os num contexto prático aquando do exercício profissional. O crescente aumento da tecnologia científica, a evolução dos conhecimentos médicos, cirúrgicos e biológicos tornou possível a recuperação e tratamento de patologias que até então seriam consideradas irreversíveis, limitando assim o tempo de vida do ser humano.

Há algumas décadas atrás, morrer em casa, junto dos familiares e amigos, respeitando as crenças e costumes da pessoa doente em fase terminal, eram considerados um processo digno e natural do ciclo vital do homem.[3] Actualmente a morte perdeu o carácter familiar e social que possuía; cada vez mais as pessoas morrem em instituições hospitalares cercados de fios e maquinaria, muito frequentemente “abandonados” numa maca do serviço de urgência ou na solidão de um internamento, sem o carinho e o apoio dos entes queridos, sem a dignidade de que é merecedor qualquer ser humano. Assim, o viver mais em quantidade de anos poderá não implicar viver melhor, com melhor qualidade de vida.

Será que nos Serviços de Saúde Em Portugal, se ajuda a Morrer??


[1] LEPARGNEUR, Hubert – Lugar actual da morte. Antropologia, Medicina e Religião. São Paulo, 1986: 28,29
[2] RAHNER, Kart - Sentido teológico de la muerte. Barcelona, 1965: 60

[3] Cf SERRÃO, Daniel – Ética em Cuidados de Saúde. Porto Editora, 1998: 86